quinta-feira, 7 de novembro de 2013

A CAIXA PRETA DAS LOTERIAS,
por Milton Saldanha*

Num país com tanta corrupção, o Brasil, é lícito desconfiar de tudo. Principalmente quando se paga por algum produto ou serviço. O ex-governador Leonel Brizola, por exemplo, nunca escondeu sua desconfiança com as urnas eletrônicas, uma invenção brasileira. Por se tratar de uma caixa preta, portanto sem acesso aos interessados, e com os recursos tecnológicos de hoje, no campo da informática, quem pode garantir que ali não possa ser injetado algum tipo de programa, um vírus, que transforme, por exemplo, cada três votos do candidato X num voto para o candidato Y? 

No caso das loterias federais, o jogo de azar, constitucionalmente ilegal, mas no caso bancado pelo próprio governo federal através da Caixa Econômica Federal, não é de hoje que desperta desconfianças entre o público. Os famosos Anões do Orçamento, deputados federais que roubaram acintosamente, alegavam publicamente que tinham ganhado sucessivamente nas loterias. Não me lembro de alguma prova que tenha apresentado disso, mas fica implícito que tinham lavado dinheiro com esse artifício. Como? Eis uma pergunta que ficou sempre sem resposta. Raposas só comem galinhas, não costumam devorar outras raposas. Ou seja, seus pares nunca levaram a fundo as investigações, muito menos exigiram o ressarcimento aos cofres públicos dos valores de lá surrupiados.

Os sorteios das loterias são públicos e quase sempre documentados, ao vivo, por alguma TV. Além, ainda, de contarem com a presença de auditores, que avalizam a lisura de todo o processo. Antigamente, falava-se que algumas bolinhas eram molhadas antes, inchavam, e assim não passavam pelo estreito funil que conduz ao número premiado. Era uma hipótese, isso nunca foi investigado e nada ficou provado. Pergunta: de que material, hoje, são feitas as bolinhas? 

Mas a grande caixa preta não está no sorteio, que tudo indica ser realmente honesto. A grande caixa preta está no tempo que transcorre entre o sorteio e o anúncio dos vencedores. O que ocorre nesse período? Como são processados os resultados das apostas colhidas em todo o país? Por que esse trabalho não é também feito publicamente? Por que a equipe que processa isso não fica em confinamento, sem conhecer o resultado do sorteio até os segundos finais, quando não haveria mais tempo para qualquer tipo de fraude? E a ultima e principal pergunta: quem me garante que, uma vez divulgado o resultado, alguma engenharia especialmente bolada não o infiltre, com todas as simulações de um jogo normal, entre as apostas de uma determinada cidade?

Como milhões de pessoas, de vez em quando sou apostador. Como pagantes, nos cabe o legítimo direito a ter todas as respostas para todas as dúvidas. Não somos obrigados a saber nada, mas temos o direito de desconfiar de tudo. É obrigação das autoridades esclarecer e tranqüilizar a população. Esse processo todo precisa ser mostrado e explicado. Ou estaremos sempre desconfiados, principalmente porque a norma, ou lei, assegura o sigilo do vencedor.  
* Milton Saldanha, 67 anos, gaúcho, é jornalista desde os 17 anos. Trabalhou na imprensa de Santa Maria (RS) e Porto Alegre. Vive em São Paulo há mais de 40 anos. Passou por muitos empregos, entre eles Rede Globo, Estadão, TV Manchete, Diário do Grande ABC, Jovem Pan, revista Motor3, Ford Brasil, IPT, Conselho de Economia e vários outros, inclusive na Ultima Hora. Ao se aposentar, criou o jornal Dance, já com 19 anos. É autor dos livros “As 3 Vidas de Jaime Arôxa” (Editora Senac Rio); “Maria Antonietta, a Dama da Gafieira” (Phorte Editora) e “O País Transtornado” (Editora Movimento, RS). Participou da antologia de escritores gaúchos “Porto Alegre, Ontem e Hoje” (Editora Movimento). 

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