Ouço muito a discussão sobre a eficiência dos carros elétricos, sobre a forma de se obter essa energia, falta de infraestrutura de recarga e até a questão de que um veículo a combustão abastecido apenas com etanol pode ser quase tão bom para o meio ambiente.
Isso me faz pensar em quantas tecnologias vi passar nesses meus mais de 60 anos de atividade. A conclusão a que chego é que o mercado, a sociedade e os nossos recursos e necessidades é que decidem quais terão sucesso e permanecerão no mercado ou não.
Também me faz lembrar de uma tecnologia que surgiu no final do século XIX, foi muito utilizada na primeira metade do século passado e, apesar de ter ajudado o Brasil durante e logo após a Segunda Guerra Mundial, acabou não tendo sucesso e sendo abandonada, o gasogênio.
Durante a Segunda Guerra Mundial, que se prolongou do final dos anos de 1930 até a metade da década de 1940, as corridas de automóveis foram prejudicadas em todo o mundo, pelo trauma provocado pelo conflito e também pela indisponibilidade do transporte marítimo, o que provocou a escassez de petróleo.
No Brasil, por decreto do presidente da República, o gaúcho Getúlio Vargas, foi imposto em 1941 o necessário racionamento de gasolina, o que obrigou uma parcela de motoristas a converterem seus carros para funcionar com gasogênio (gás obtido por meio da queima de carvão ou de lenha).
Não existia a tecnologia atual, muito mais eficiente e moderna desenvolvida para a utilização do GNV (gás natural veicular).
A atividade que mais fez uso do gasogênio foi a corrida de automóveis porque, rapidamente, os mecânicos especializados revelaram a sua competência ao adotar o novo equipamento pela inexistência de outros combustíveis até que a guerra e o racionamento terminassem.
A primeira corrida de automóveis equipados com gasogênio foi realizada no Rio Grande do Sul, no dia 18 de julho de 1943, com vitória de Norberto Jung, da família proprietária da revenda Ribeiro Jung, representante da Ford.
Os estados de São Paulo e do Rio Grande do Sul, pela tradição automobilística, destacaram-se na disputa de corridas com o equipamento e desde essa época foi criada uma esportiva rivalidade entre o gaúcho Catarino Andreatta e o paulista Francisco Landi, que foram os mais vitoriosos em suas regiões. Mas Landi conquistou o título de Rei do Gasogênio, pelas vitorias nos campeonatos de 1943, 1944 e 1945.
Algumas grandes empresas nacionais interessaram-se pela produção do sistema de gasogênio que se transformou em uma oportunidade de negócio e além delas, outras de pequeno porte surgiram por todo o território nacional. E até o piloto Chico Landi criou uma empresa para a produção do sistema.
A Ford, com a instalação da pioneira fábrica de veículos no Brasil em 1921, iniciou a venda do gasogênio em 1940 com garantia de assistência técnica em todo o País por intermédio de sua ampla rede de revendedores.
A General Motors também realçava a sua rede de revendas e concessionárias presentes em todos os estados brasileiros.
Além da Ford e da General Motors, o gasogênio também foi produzido por outras empresas, como a Tecnogeral, fabricante de armários de aço, que procurou atrair os clientes realçando a beleza do equipamento e a novidade de autonomia de 100 quilômetros.
Gasogênio é um equipamento que produz gás combustível para alimentar motores a combustão. Converte matérias-primas sólidas e líquidas em gás.com a geração de monóxido de carbono, nitrogênio, dióxido de carbono, hidrogênio e metano.
A adoção do gasogênio foi acelerada após a patente do motor Otto expirar em 1886. O potencial e aplicabilidade prática da gaseificação para motores de combustão interna foram bem compreendidos desde os primeiros dias de seu desenvolvimento.
Para ser utilizado, o gasogênio requeria um equipamento instalado na traseira dos veículos que produzia o gás para o funcionamento do motor e garantir o deslocamento dos automóveis e também de caminhões, tratores e diferentes máquinas operativas. Era um grande equipamento que produzia o gás para o funcionamento do motor.
Naturalmente não havia nenhuma preocupação com o meio ambiente e parte dos proprietários de veículos decidiu optar pela instalação do sistema para se locomover com seus veículos.
Foram poucos os proprietários que se arriscaram a usar o equipamento pela conscientização ecológica, mas a maioria não gostou do volumoso aparelho instalado na traseira do veículo, com peso total que chegava próximo a 100 quilos e que, além de mau aspecto estético, alterava as reações dos automóveis pela inadequada distribuição de peso, o desagradável aspecto visual e a dificuldade de gerar o gás necessário para o funcionamento do motor.
Um morador próximo de onde minha família residia foi um dos que decidiram instalar o gasogênio em seu Ford 36, único do bairro, e apesar de minha tenra idade de 7 anos, eu sentia satisfação em ajudá-lo, todas as manhãs, a girar a ventoinha que mantinha o processo de queima do carvão para gerar o gás que alimentava o motor.
Por ser um processo demorado, depois de alguns dias o simpático vizinho acabou fazendo como a maioria dos proprietários de automóveis: recorreu a cavaletes de madeira para manter o carro suspenso, sem contato com o solo, para não estragar os pneus que perdiam pressão pelo longo período paralisado. E esperar pelo fim da guerra fazendo uso dos bondes e dos ônibus que existiam para chegar ao local de trabalho.
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*Luiz Carlos Secco trabalhou, a partir de 1961 até 1974, na empresa S.A. O Estado de São Paulo e Jornal da Tarde, além da revista AutoEsporte. Posteriormente, transferiu-se para a Ford, onde foi responsável pela comunicação da empresa. Com a criação da Autolatina, passou a gerir o novo departamento de Comunicação da Ford e da Volkswagen. Em 1993, assumiu a direção da Secco Consultoria de Comunicação.
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