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terça-feira, 7 de maio de 2019

NO FAROL, O JEITINHO ITALIANO?
Por Chico Lelis*



Corria o ano de 2011 e lá estávamos, eu e meu querido amigo Vicente Alessi, viajando pela Itália, num poderoso Alfa Romeo, cedido pela Fiat. Nem precisava tanta potência, pois só viajamos pelas estradinhas vicinais onde, além de não pagar pedágio, é possível conhecer melhor o País e as pessoas.

Eu dirigia, pois o Vic, alegando preguiça, se recusava a pegar no volante. Pra mim, tudo bem.

Depois de vários quilômetros e visitas, entre outras, a Prato (onde tem um maravilhoso Museu, o do Tecido), à Torre de Piza, menos torta que muitos prédios aqui da orla da minha amada Santos. E temos uma vantagem, além do Santos FC, claro! Enquanto a torre italiana não pode receber visitas, os prédios tortos de Santos são habitados.

Bem, seguindo por uma dessa estradinhas, passando por pequenos vilarejos, nos deparamos com um semáforo/sinaleira/sinal na entrada de uma delas. E estava vermelho. Ou seja, não podíamos seguir adiante.

Parei e fiquei aguardando o verde.

Com razão, Vic ficou mais impaciente que de costume e dizia: vamos embora, isso tá quebrado.

Usando minha vantagem de estar dirigindo, disse que não!

De repente, um Fiat 500, modelo antigo, passa reto e entra na cidade. Vic enfureceu, alegando que estávamos ali que nem bobos esperando abrir um semáforo que não tinha nenhuma serventia.

- Vamos logo, isso ai tá quebrado.

Mas não obedeci suas ordens.

Segundos depois veio o verde e seguimos adiante.

Nestas pequenas localidades, há sempre uma área para se parar, naquela que é a única e estreita via dos lugares. 

Resolvemos parar e fomos elucidar o enigma do semáforo.

A resposta foi muito simples.

- Nossa rua é muito estreita, temos crianças e idosos andando por ai e não queremos que corram risco, com carros vindos de um lado pro outro.

Quanto ao Cinqüecento que desobedeceu ao sinal: "era um morador da terra. E nós podemos. Simples assim".

Como era hora do almoço, fomos comer num pequeno e encantador restaurante, debruçado sobre um vale, com uma comida dos deuses.

O único desentendimento entre nós na viagem, foi que o Vic se recusou a ir até Pistoia, onde poderíamos conhecer o cemitério onde estavam enterrados os corpos dos nossos heróis da II Guerra Mundial. 

Ah, ia esquecendo. Como fumava o meu amigo Vic!





chicolelis - chicolelis@gmail.com - Jornalista com passagens pelos jornais A Tribuna (Santos), O Globo e Diário do Comércio. Foi assessor de Imprensa na FordGoodyear e, durante 18 anos gerenciou o Departamento de Imprensa da General Motors do Brasil. Assina a coluna “Além do Carro”, na revista Carro, onde mostra ações do setor automotivo nos campos Social e Ambiental. 

quarta-feira, 27 de março de 2019

UM SAPATO MUITO LOUCO.
Por Chico Lelis*


Ganhara dos filhos. Era um lindo par de sapatos. Marrons, como ele gostava. 

Lembravam muito o velho e bom "Indio Mock", da Clark, de saudosa memória. Macio, solado de borracha.

Confortável, super confortável!

Trazia, junto com a lembrança do "índio", todos os sabores de aventuras e prazeres da juventude que já se fora há alguns anos. Estava ansioso para usá-lo, mas não o estrearia logo. Aguardaria uma ocasião especial. Afinal, o sapato era também especial. Presente dos filhos, com suas primeiras mesadas, e queria uma estreia com sabor de retomada da juventude. Tinha que ser mesmo particularmente especial, como o presente era. Algo digno daquele sapato.

Esperou alguns dias e, finalmente,  a oportunidade chegou. Parecia ter sido criado para aquela a "inauguração". Era como uma noite de gala na Ópera. O sapato estava ali, ainda no saco de flanela. Virgem, esperando pelo instante de abrigar o pé daquele que lhe tratava com  tamanha pompa e circunstância. Por ser novo, o sapato jamais ouvira falar de algo assim. Tanta atenção para alguns pedaços de couro unidos por costuras. Só os velhos sapatos têm sabedoria para entender isso. 

As mãos chegaram a tremer quando o sapato foi tocado. Os pés sentiram também a mesma sensação ao mergulharem naquele novo par. Ficaram confortáveis, bem instalados. Mas havia algo que lhe causava um grande calafrio. Examinara bem. O couro era da melhor procedência. Tinha forro e uma ótima palmilha. As costuras com traçado firme. Um acabamento mesmo de primeira.

Os filhos souberam escolher.

Finalmente na porta de casa. Rumo ao grande acontecimento. E, apesar de  muito bem calçado, jamais chegou ao destino.

E, daquele dia em diante, usando aqueles lindos sapatos, jamais chegou a lugar nenhum que programasse. Queria ir para o sul. Seguia rumo ao leste. Deveria seguir pela esquerda, mas acabava indo pra direita. Sempre assim!

Com ele calçado, sua vida perdera a direção. Não mais conseguia mandar em seu rumo. Um dia, em desespero, olhou para os pés e pensou no que estaria acontecendo. Porque não mais obedeciam ao comando do seu cérebro. Mexeu os dedos. Esfregou pé no pé e não achava a resposta.

Resolveu consultar um psiquiatra-ortopedista, mas não sem antes fazer uma última tentativa. Calçou novamente os sapatos. Surpresa! Ali estava a resposta para todos os rumos errados. Para todas as desobediências de caminho.

Seus lindos sapatos tornavam-se horrivelmente tortos em seus pés. Ele jamais percebera isso, Não havia mesmo como chegar a ponto algum pré-determinado com eles nos pés. Nem GPS/Waze que o levassem ao destino programado. Com eles, tortos, não tinha como determinar um rumo. Iam mesmo para qualquer lugar. Qualquer direção.

Tirou os sapatos. Calçou outro e foi para onde quis. Jogar seus lindos sapatos fora? Qual o que!

Guardou-os cuidadosamente no saco de flanela. Para  usá-los quando quisesse sair por aí.

Sem rumo!









chicolelis - chicolelis@gmail.com - Jornalista com passagens pelos jornais A Tribuna (Santos), O Globo e Diário do Comércio. Foi assessor de Imprensa na FordGoodyear e, durante 18 anos gerenciou o Departamento de Imprensa da General Motors do Brasil. Assina a coluna “Além do Carro”, na revista Carro, onde mostra ações do setor automotivo nos campos Social e Ambiental. 



terça-feira, 19 de março de 2019

CONHECIA ESSA OFICINA?
Por Chico Lelis*


Se você nunca foi a Santo Antônio do Pinhal, não sabe o que está perdendo. É uma bela e pequena cidade, encravada na Mantiqueira, com deliciosos lugares para se almoçar, jantar, tomar bons vinhos; cervejas artesanais, ou não.

Passeios deliciosos pelas matas que a cercam. E boas pousadas para passar as noites, que são muito frias no inverno, que vez por outra baixa do 0° e que, nestes tempos de verão, dorme-se com temperaturas entre 18º e 20º.

Ah, tem uma ótima padaria, a Viola, onde além de um pão de qualidade, um monte de bolos, com destaque para o de Aipim, a preços honestos, sem exploração dos turistas.

Tem também o bar do Pimenta, um lugar muito especial, onde a cachaça Amélia - honesta, que está no mercado há mais de 100 anos - é a rainha do lugar, ocupando praticamente todas as prateleiras. Sem grandes tentações, é o lugar próprio para quem gosta de prosear com gente da terra. La, tudo se conhece sobre a história da cidade e o que acontece nela, em prosa ou verso.

Uma coisa que poucos sabem é que lá em Santo Antônio, nasce o Rio da Prata. Sim, aquele mesmo Rio da Prata que banha Buenos, Aires, na Argentina.

Um mecânico diferente


E era lá em Santo Antônio que existia, ali na Estrada Municipal do Pico Agudo (lugar imperdível para visitar) a Cabana do Voador, onde seu dono consertava disco voador, como anunciava a placa na porta: CONSERTA-SE DISCO VOADOR, conforme a imagem que registrei no final do ano passado, quando a oficina ainda funcionava a pleno vapor, com discos voadores aguardando sua vez.

Existia, porque de uma hora para outra, as placas sumiram e seu dono também. Um amigo, frequentador de Santo Antônio, garante que ele foi abduzido, já que os marcianos tiveram uma evasão de mecânicos lá de Marte e precisavam de mão de obra especializada, como aquela que encontraram ali na Mantiqueira, onde já consertavam seus discos em suas incursões pela Terra.

Serviço: Santo Antônio fica a 170 km de São Paulo. O melhor acesso é pela Ayrton Senna (mas pode ser pela Dutra também), Carvalho Pinto e Floriano Rodrigues Pinheiro, que leva até Campos do Jordão.  Mas antes disso, logo após o túnel desta, deve-se pegar o caminho para Sul de Minas.








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quinta-feira, 7 de março de 2019

A MAGIA DA MÁQUINA DE ESCREVER.
Por Chico Lelis*


Ouve só.

A gente esvaziando a casa da tia neste carnaval. Móvel, roupa de cama, louça,  quadro, livro. Aquela confusão, quando ouço dois dos meus filhos me chamarem.

 - Mãe!

 - Faaala.

 - A gente achou uma coisa incrível, mágica! Se ninguém quiser, pode ficar para a gente? Hein?

 - Depende. Que é?

Os dois falavam juntos, animadíssimos.

 - Ééé... uma máquina, mãe.

 - É só uma máquina meio velha.

 - É, mas funciona, está ótima!

Minha filha interrompeu o irmão mais novo, dando uma explicação melhor.

 - Deixa que eu falo: é assim, é uma máquina, tipo um... teclado de computador, sabe só o teclado? Só o lugar que escreve?

 - Sei.

 - Então. Essa máquina tem assim, tipo... uma impressora, ligada nesse teclado, mas assim, ligada direto. Sem fio. Bem, a gente vai, digita, digita...

Ela ia se animando, os olhos brilhando.

 - ... e a máquina imprime direto na folha de papel que a gente coloca ali mesmo! É muuuito legal! Direto, impresso na mesma hora, eu juro!

Eu não sabia o que falar. Eu também juuuro que não sabia o que falar diante de uma explicação dessas, de menina de 12 anos, sobre uma máquina de escrever.

Era isso mesmo?

 - ... entendeu mãe?... zupt, a gente escreve, muda de linha e a gente até vê a impressão tipo na hora, e não precisa essa coisa chata de entrar no computador, ligar, tipo esperar hóóóras, entrar no word, de escrever olhando na tela, mandar para a impressora, esse monte de máquina, de ter que ter até estabilizador, comprar cartucho caro, de nada, mãe! É muuuito legal, e nem precisa de colocar na tomada! Funciona sem energia e escreve direto na folha da impressora!

 - Nossa, filha...

 - ... só tem duas coisas: tipo não dá para trocar a fonte nem aumentar a letra, mas não tem problema. Vem, que a gente vai te mostrar. Vem...

Eu parei e olhei, pasma, aquela máquina, tipo velha. Eles davam pulinhos de alegria.

- Mãe. Será que alguém da família vai querer? Hein? Ah, a gente vai ficar torcendo, torcendo muito para ninguém querer para a gente poder levar lá para casa, isso é o máximo! O máximo!

Bem, enquanto estou aqui, neste 'teclado', estou ouvindo o plec-plec da admirada máquina, que, claro, ninguém da família quis mas que, aqui em casa, já deu até briga, de tanto que já foi usada. Está no meio da sala de estar, em lugar nobre, rodeada de folhas e folhas de textos "impressos na hora" por eles. Incrível, dizem, plec-plec-plec, muito legal, plec-plec-plec.

Eu e o Zé já estamos até pensando em comprar outra, ficando uma para cada filho.

Mas, pensa bem se não é incrível mesmo para os dias de hoje: sai direto, do teclado para o papel, e sem tomada!

Obseste brilhante texto não é meu e nunca descobri sua autoria. Mas seria muito egoísmo de minha parte, não dividi-lo com quem não o conhecia.








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domingo, 24 de fevereiro de 2019

SÉRGIO APARECIDO, O UNÂNIME!!!
Por Chico Lelis*

Serginho e seus vícios: Elvis, na gravata, e o cigarro entre os dedos.

Com certeza, alguns, entre o pessoal da nova geração da Toyota (que hoje comemora seu Dia Mundial), não conheceram o Sérgio Aparecido que atuou no setor até o início deste século, pelo jornal A Tribuna, onde ele foi, no início dos anos 70, um dos pioneiros no jornalismo automotivo, com o seu Jornal Motor. Mas, com certeza também, Mark Hogan, um dos nomes importantes, hoje na Toyota, conheceu o Serginho, que era unanimidade no setor, com seu bom humor, sacadas geniais e grande profissionalismo. Era apaixonado por carros. E pelo Elvis Presley.

Serginho era capaz de coisas sensacionais como, por exemplo, fazer com que o ponteiro do marcador de gasolina ser mais rápido que o do velocímetro, numa incrível viagem entre Santos e São Bernardo, de apenas 40 km, consumir o tanque de um Charger RT, que chegou à sede da Chrysler com pane seca. 

Outra foi numa edição do Salão de Paris, tirar do ar a CNN, quando, involuntariamente, puxou o cabo que levava energia para o estúdio que a emissora ali montara para cobrir o evento. Ele puxava um carrinho, levando press kits que eram distribuídos pelas montadoras. Hoje eles foram substituídos pelo pen drive ou um simples endereço do site.

Contando com o bom humor do Serginho, seus colegas brasileiros lá em Paris, prendiam o carrinho para perturbar o pobre coitado. Só que, uma hora o Serginho perdeu a paciência e puxou com muita força o carinho que estava preso. Mas não era nenhum colega e sim os cabos da CNN, que saiu do ar. Um enorme segurança aproximou-se nervoso e perguntou, em inglês, o que ele estava fazendo ali. “Just walking” foi a resposta. De onde você é? E veio a resposta que só o Serginho poderia dar: “I am from Argentina”. E foi embora.

Elvis, sua paixão

Nunca vi um cara amar tanto um ídolo, como o Serginho amava Elvis Presley (bem, talvez o Ricardo Caruso, que até já escreveu um livro sobre o cantor e tem pedras da casa dele). Na sua casa tinha até um telefone que tocava com a voz de Elvis cantando “Love me tender”. Amava e imitava o ídolo. Uma vez, numa casa de espetáculo em São Paulo fomos, eu ele e o Caruso, ver “o melhor cover de Elvis Presley do Brasil”. Os dois não escondiam a ansiedade. Serginho foi com uma bela camisa com a estampa do Rei do Rock.

Quando o artista entrou, com cabeleira e roupa iguais as do cantor, pensei que os dois iam ter um “treco”, tamanha emoção. O show começou e o cover passando entre as mesas, ia entregando o microfone para alguns frequentadores. Foi seu erro. Quando o deu na mão do Serginho, ele se inflamou e mandou lá um “Love me tender” e o público “veio abaixo”, não parando de aplaudir. E o Serginho não queria parar de cantar.

Quando devolveu o microfone para o artista ainda se ouvia: deixe ele cantar, deixe ele cantar!!!!!! Ele era melhor que o cover. Muito melhor!

Na casa do Rei, o desmaio

Outra dele com o Elvis, esta na casa do seu ídolo, em Memphis, nos EUA. Em visita à casa, Serginho conseguiu que a zeladora o autorizasse a vestir a roupa de Elvis (há dúvidas sobre essa autorização, mas aqui o que vale é a versão e não o fato). Ao sair do quarto para ir até o salão onde encontraria seus colegas, Serginho não viu uma porta de vidro e... pum!!!!! Desmaiou!

Há que garanta que, antes de bater com a cabeça no vidro, ele já havia desmaiado. De emoção, da mais pura emoção, por estar vestindo as roupas do Rei. Na casa do Rei.

Na última quarta-feira, Serginho foi ao encontro da sua maior paixão, o Rei, Elvis Presley, que não morreu. Assim como acontecerá com as nossas lembranças do Serginho, nosso querido amigo.







chicolelis - chicolelis@gmail.com - Jornalista com passagens pelos jornais A Tribuna (Santos), O Globo e Diário do Comércio. Foi assessor de Imprensa na FordGoodyear e, durante 18 anos gerenciou o Departamento de Imprensa da General Motors do Brasil. Assina a coluna “Além do Carro”, na revista Carro, onde mostra ações do setor automotivo nos campos Social e Ambiental. 



terça-feira, 19 de fevereiro de 2019

CENAS URBANAS.
Por Chico Lelis*


A sede bateu e a farmácia foi providencial. Ali encontrei água mineral, sem gás, para comprar e, também ali, assisti a uma das mais belas cenas dos últimos tempos. Uma moça, meio fora do peso, vestindo blusa verde e saia preta, entrou na farmácia, e foi direto para a balança.

Senti algo no ar e continuei olhando para ela que subiu na balança, colocou a bolsa no ganchinho tirou o sapato e, quando viu o resultado da pesagem, transformou-se no artilheiro do time, fechou os punhos, balançou-os, sorriu e soltou um "yes" de conquista. 

Um sorriso largo, lindo, emocionante. E quando olhei nos seus olhos, eles lacrimejavam. 

Com certeza vencera uma etapa da guerra com a balança e demonstrou isso para quem quisesse ver. 

Eu vi e fiquei feliz por ela, que saiu da farmácia com um sorriso. Torço para que ele se repita na próxima passagem pela droga Raia, na esquina da Conselheiro Nebias com a Afonso Pena, na minha amada Santos. 











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quarta-feira, 13 de fevereiro de 2019

UM CONTO:
A HISTÓRIA DE UMA CASA.
Por Chico Lelis*

                                                                                                                                                               Foto: Blog do Ralph Giesbrecht

Era uma casa charmosa. Não exatamente bonita pelos padrões atuais de arquitetura, mas muito, muito charmosa. De rara elegância.

E era também orgulhosa. Sabia que era a mais bem tratada da rua dos Albéricos (ninguém nunca soube o porquê do nome, nem conheceu ninguém com ele que lá tenha morado). Seus encanamentos eram de primeira, em cobre, assim como a parte elétrica. Tudo com manutenção preventiva. O telhado era um primor e abrigava um simpático sótão, usado como atelier de costura e também escritório. Pé direito com quase 4 metros de altura, azulejos portugueses, todos os cômodos grandes e uma largueza de cozinha e copa. Aqueles armários, despensa, lavanderia, quarto de empregada, com banheiro anexo. Muito melhor que os empreendimentos modernos com varanda gourmet.

Pintura? Todos os anos. Pena que não podia palpitar na cor. Bem que gostaria. Iria pedir aos Souza que usassem uma tal de marrom-toledo, pois, pelo som, ela lhe cairia muito bem.

Mas, naquele ano o amarelo-claro era a cor. No jardim, girassóis, camélias, rosas e margaridas encantavam os passantes. No quintal, a horta abrigava pés de tudo. Tinha  couve, alface, tomate, cebolinha, coentro, cheiro-verde, abobrinha, pimenta, e tudo o que se quisesse imaginar. Tempero não precisava comprar, pois ali de tudo se encontrava.

Tinha também mamona, ótimo produto para manter fortes e bonitos os cabelos, comigo-ninguém-pode e espada de São Jorge para “proteção” da família. Algumas bananeiras, dois pés de “mixirica”, outro de carambola, que hoje chamam de estrela e vai até em salada, e um de jabuticaba. Uma delícia de quintal! Ah, tinha também alguns patos, galinhas, que produziam ótimos ovos. Tudo muito bem cuidado pela vó Eva que também respondia pela cozinha, com a ajuda da Luzia, sua simpática colaboradora há mais de 30 anos. Juntas elas faziam coisas que até os deuses chegavam para almoçar ou jantar.

Por dentro, uma decoração simples e aconchegante. Seus donos eram ‘do bem”. Gente boa mesmo. Nos quartos das crianças, a decoração, se é que se pode chamar assim, era resultado da idade de cada um: a menina, com 11 e o garoto, com 14. No do Sérgio, hoje quase avô, fotos do Pelé  e Garrincha e Cláudia Cardinale nas paredes. E uma bagunça em volta da escrivaninha, com as meias, tênis, shorts e camisetas, sempre fora do lugar. Na época ainda não existiam as modernidades eletrônicas dos dias atuais.

No da Flávia, que hoje viaja pelo mundo fazendo palestras sobre o meio ambiente, tudo arrumadinho. A escrivaninha sempre correta e fechada após o uso. Cada coisa no seu lugar, inclusive as bonecas, sempre penteadas e usando roupinhas limpas. Uma doçura!

Mas cada um era dono do seu nariz e, neste aspecto, ninguém se intrometia no quarto alheio.

Na suíte dos pais, Carlos e Maria Ignês, um ambiente com cara de pais. Nada mais, nada menos. Uma Sonata para tocar os LPs românticos nos momentos íntimos do casal, uma bela e antiga penteadeira, armários embutidos combinando. Tudo muito bem cuidado, se bem que, vez por outra, sobrava um par de meias, masculinas, (sempre elas) ao lado da cama.

A casa não poderia estar melhor localizada. A rua era  larga, “tranquila”, muitas árvores, pavimento ainda em bom paralelepípedo e apenas trânsito local. As casas vizinhas tinham características muito semelhantes, mas não eram como ela. Eram todas muito bem cuidadas, com suas calçadas sempre limpas e muros baixos que deixavam ver seus jardins, mas não tão bonitos como o da 148, onde moravam os Souza.

Quem morava na rua?

Pessoas tão boas quanto os da casa 148. Tinha comerciante, bancário. Do Banco do Brasil, claro! Dois médicos, um doutor engenheiro da Light. Aposentados que moravam com seus filhos, como a dona Eva, que era a dona da casa. Tudo gente boa, que se conhecia desde sempre. Gente que se dava bem. Tão bem que geraram alguns casamentos ali na rua mesmo. A Cidinha, do 35, por exemplo, casou com o Jorge, do 38. Passaram muito tempo se olhando das respectivas janelas. Depois, tinham uma janela só. Seus dois filhos ganharam também suas janelas. Moravam com o pai dela, aposentado.

De vez em quando, surgia uma briga de moleques. Mas era  tudo resolvido na hora, com um ou outro puxão de orelhas. E a vida na rua voltava ao normal.

Os cães andavam por lá, meio que soltos. Os gatos também. Mas não havia chance de brigas. Não que a harmonia da rua influenciasse cães e gatos, tornando-os amigos. É que, por uma razão de segurança, os gatos andavam sempre sobre os muros, só correndo riscos quando atravessavam de um lado para o outro.

E não pensem que aquela era uma rua numa cidadezinha longe da capital. Era ali mesmo, na grande metrópole, mas tinha a cara de viela de cidade do interior. E das pequenas.

A casa se sentia muito feliz ali.

Pela manhã, o movimento das crianças, que saíam de casa, malas nas mãos (ainda não haviam inventado a mochila escolar), chutando pedras, chamando os amigos atrasados, fazendo confusão com os cachorros, espantando os gatos. Quando a molecada ia pra escola, o sossego da rua acabava e ninguém mais dormia naquela rua. Mas era coisa de 10 15 minutos e a paz voltava.

A vida era harmoniosa na rua daquela casa.

Mas, num dia qualquer, a rua dos Albéricos acordou mais cedo,  com um bando de pessoas estranhas andando de lá pra cá, de cá pra lá. Carregavam nas mãos uma coisa que mais parecia um binóculo. - O que estariam fazendo ali? - pensou a casa dos Souza.

- Que povo é este tirando a tranqüilidade da nossa rua? Indagou a casa a si própria, sem resposta.

- Que tanto eles olham com aqueles binóculos? Estão me vigiando. Tenho certeza disso. Por quê? Será que estão me medindo para aumentar o IPTU? Coitado do meu dono, já gasta tanto dinheiro com imposto e não recebe nada em troca.  Paga IR, INPS, “I” isso, “I” aquilo e nenhum retorno. Ele também paga a Guarda Noturna. A única coisa boa grátis era a escola pública, que perdeu a qualidade depois do período militar e nunca mais se recuperou. Ela lembrou que ele também fazia poupança para ter uma aposentadoria decente, porque se fosse depender do governo, ia morrer de fome quando parasse. É só imposto, imposto, imposto. E muita promessa.

Os homens de “binóculos” ficaram por ali de um lado pro outro, anotando, anotando, pela manhã inteira e se foram sem que ninguém conseguisse descobrir do que se tratava. E as vidas da rua e da casa 148 voltaram ao normal.

É preciso abrir parênteses para contar que ninguém soube do que se tratava porque, justo naquela manhã a dona Pura, a fofoqueira, que sabia de tudo,  na rua, tinha ido ao Centro, para compras, e só voltou à tarde.

Tempos depois, antes que ela conseguisse saber o que acontecia, os moradores da rua receberam um questionário da prefeitura perguntando sobre seus destinos: dali, iam pra onde? Centro, outro bairro, fora da cidade? Não havia explicações para as perguntas. As pessoas estavam satisfeitas com suas vidas?

Gentis que eram, responderam sem dar muita atenção à pesquisa. Todos é modo de dizer, porque a dona Terezinha, da casa 53, não respondeu. Era gente boa, mas muito rabugenta e avessa a que alguém se metesse na sua vida.

- Pra que querem saber da minha vida? Eu vou pra onde quero! - esbravejou!

Mas, num outro dia, ensolarado, em que cães e gatos seguiam cada qual pelo seu caminho, apareceu uma perua com alto falante - exatamente como aquelas que vendem “Pamonhas, pamonhas fresquinhas de Piracicaba” - anunciando “uma nova vida no bairro”. O locutor falava de transporte público, linhas de ônibus, melhor acesso ao centro.

Faixas foram colocadas anunciando a criação de linhas de ônibus para “facilitar” a vida de todos.

E, o pior: a prefeitura iria asfaltar a rua dos Souza.

A casa não entendia nada. Nunca soubera que alguém na rua reclamara da falta de nada. Ela, nas conversas com as outras casas, só ouvia elogios para o sossego do lugar.

E, se a casa não entendia, os moradores muito menos. Afinal, a escola era perto e a molecada ia e voltava a pé.  Para ir ao centro, quem não tinha carro, não se importava de andar três quarteirões para pegar o ônibus da avenida. O paralelepípedo, que fora bem assentado, não causava problemas, a não ser quando o “boyzinho” da 147 acelerava demais o Opalão do pai em dia de chuva. Era o maior auê e uma enxurrada de reclamações da rua inteira.

- Devem ser aquelas coisas de político que inventavam (e inventam até hoje) pra atormentar a vida das pessoas. Onde já se viu – esbravejava dona Terezinha – ônibus na nossa rua?! Aqui vai virar um inferno, ainda bem que o falecido não viu isto, porque ele iria morrer de tristeza.

Aquilo uniu ainda mais os vizinhos dos Souza. Fizeram inúmeras reuniões, prazerosamente fornidas de bolinhos de chuva que a dona Eva preparava com esmero e carinho. Foram falar com o vereador do bairro que, claro, lamentou-se, esquivou-se e nada resolveu, como sempre fizeram e fazem, ainda, todos os políticos desta terra descoberta por Cabral.

Correram à prefeitura e lá o alcaide também tirou o corpo fora, dizendo que não podia impedir o “progresso”.

E ele chegou com o asfalto, linhas de ônibus, um roubo aqui, outro ali. E com a maior das tristezas. Dona Terezinha ficou doente, os filhos venderam a casa e foram todos embora. O vizinho dela também desistiu de enfrentar aquela bagunça e foi-se. No lugar das duas casas surgiu o magnífico “Chateaux La Plage”, que tinha apartamentos com cinco suítes, 18 vagas de garagens, segurança máxima, piscina, quadra de tênis, de bocha, academia de ginástica. Um primor de lançamento. Mas, mesmo com a enorme garagem, sempre tinha muito carro sobrando e já não havia como parar carros dos visitantes na rua dos Souza.

Mais gente se mudou deixando terrenos para novos e modernos empreendimentos imobiliários. Cada vez mais sofisticados. Cada vez maiores e mais altos.

E a casa foi ficando preocupada com aquilo. O próximo prédio tomou-lhe o sol. Era o fim do jardim da dona Eva. E junto com ele foi boa parte do pomar e toda a horta. Sobrando mesmo só as bananeiras, a “comigo ninguém pode” (e não pode mesmo) e um pálido pé de “mixirica”.

Naquele ano a pintura não foi programada. Nem executada. Um problema no chuveiro das crianças não foi reparado em definitivo, apenas um consertozinho. Algo havia na casa dos Souza e ela começou a ficar preocupada. Mais ainda quando foi programada uma viagem de férias de todos. Antes de viajarem, os Souza falaram sobre os problemas da rua, da dificuldade em viver sem o sol, sem os amigos que os haviam deixado, praticamente sozinhos nas ruas. Até os gatos sumiram.

E saíram em férias.

E lá deixaram a casa, fechada, às escuras, sem sol e sem o canto dos pássaros que há muito deixaram de “freqüentar” aquela outrora pacata e atraente rua para os bichos de penas.

Foi duro para ela. Estava desesperada diante do abandono. E começou a usar todos os meios para comunicar-se com outras casas. Mandava mensagens pelas antenas da TV, pelo fio do telefone, fios da Light, canos de água, pelos passarinhos.

Pedia socorro.

Sabia que estava prestes a desaparecer e ter suas portas e janelas em pinho de riga serem disputadas por um alto dirigente da indústria automobilística, que era louco por elas.

Mas ela não ia entregar os pontos assim, sem lutar. E continuou pedindo socorro a outras casas.

Quase um mês depois, a família voltou, sem muito entusiasmo, para a rua dos Albéricos. Para a casa 148.

Ao pararem no portão, encontraram um terreno vazio.

Assustaram-se. A vó Eva não acreditava no que via e pensava se as imobiliárias teriam tido a ousadia de demolir a casa na marra – afinal, neste País, tudo é possível mesmo, não é?

Todos desceram do carro, abriram o portão e viram aquela placa, bem no centro do terreno:

MUDEI PARA A RUA DA ALEGRIA, 77.
LÁ VOCÊS SERÃO BEM-VINDOS.

Obs: a Rua da Alegria tinha apenas casas. A dos Souza estava pintada de marrom-toledo.










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sábado, 2 de fevereiro de 2019

CUIDANDO DA ÁGUA.
Por Chico Lelis*


Poucos sabem, mas o Rio da Prata, aquele que ganha fama quando chega à Argentina, nasce aqui no Brasil, mais exatamente na pequena e bela Santo Antônio do Pinhal, na Serra da Mantiqueira, onde neste terrível verão, tem noites deliciosamente frescas. Além do Prata, a Mantiqueira é responsável pelo abastecimento de água para 5 milhões de pessoas na capital paulista, por intermédio do sistema Cantareira.

Esta é uma das razões para a Fundação Toyota apoiar o Projeto Águas da Mantiqueira vem sendo desenvolvido em Santo Antônio do Pinhal, que tem por objetivo a conservação das 10 bacias hidrográficas do município cuja região abriga uma das maiores reservas de água mineral em todo o mundo. Levantar a biodiversidade da área, visando promover  a conservação por intermédio do planejamento territorial e desenvolvimento socioeconômico de forma sustentável das comunidades.

José Roberto Manna, coordenador do projeto pela Fundespag (Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa do Agronegócio), parceira da Fundação Toyota do Brasil nessa empreitada, explica que a participação da população nas discussões é fundamental para o sucesso do projeto: “Nosso objetivo é dar poder à comunidade, para auxiliar a prefeitura com informações importantes para o desenvolvimento do trabalho diário do município”.

Ele destaca que a prefeitura vem “direcionando o planejamento territorial, respeitando as características ecológicas das áreas naturais do município, que é fundamental para a conservação da biodiversidade e a continuidade do abastecimento de milhões de pessoas que dependem das águas da Mantiqueira”.

Até o Rio de Janeiro

Além de outras cidades atendidas pelas águas da Mantiqueira, , como  Sorocaba, São José dos Campos e a região metropolitana do Rio de Janeiro. Isto porque, apesar de não nascer na Mantiqueira, o Rio Paraíba do Sul ao passar pela região aumenta o seu volume d´água e segue vale abaixo, para abastecer a região metropolitana do Rio de Janeiro.

* Com a colaboração de Joel Leite, do ECO Informe. 








chicolelis - chicolelis@gmail.com - Jornalista com passagens pelos jornais A Tribuna (Santos), O Globo e Diário do Comércio. Foi assessor de Imprensa na FordGoodyear e, durante 18 anos gerenciou o Departamento de Imprensa da General Motors do Brasil. Assina a coluna “Além do Carro”, na revista Carro, onde mostra ações do setor automotivo nos campos Social e Ambiental.