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terça-feira, 24 de janeiro de 2017

EDUCAÇÃO.
Por José Renato Nalini*

A única missão

Qual a finalidade da existência? Por que se vive? A vida tem sentido? Essa indagação pode variar, mas é uma constante em várias fases da vida e em muitas faixas etárias. Para Morris Schwartz, o mais importante na vida é aprender a dar amor e recebê-lo. Deixar o amor vir. Pensamos que não merecemos amor; pensamos que se nos dermos a ele, nos enfraqueceremos. Porém, quando se aprende a amar, aprende-se a viver.

Em qualquer idade! Envelhecer não é só decair fisicamente. É crescer. Quem encontra um sentido para a vida não deseja voltar atrás. Deseja ir em frente. Quer ver mais, quer fazer mais. Para dar sentido à vida, dedique-se a amar os outros. Dedique-se a amar os outros. Dedique-se à sua comunidade. Empenhe-se em criar alguma coisa que dê sentido e significado à sua vida. Doar-me aos outros é o que me faz sentir vivo. Faça aquilo que vem do coração. Isso não depende de estímulo externo. A chave está na própria consciência. Depende apenas de cada um de nós. Uma postura menos egoísta e menos derrotista pode ressignificar todas as fases da existência e, principalmente, a velhice. Os gregos tinham o conceito “Kairós” e hoje temos de repensar “Kairós”: o tempo vivido é o tempo da experiência. O tempo do aprendizado. Todos temos condições de nos tornarmos, em qualquer fase, um novo ser, que continua a construir sua história. Envelhecer e viver são processos indissociáveis. A alternativa a envelhecer é muito dolorosa: morrer jovem.

A velhice é uma categoria cultural. Há quem continue a pensar e a agir como se o velho fosse alguém desprovido de utilidade. Por isso, o lugar do velho é sua casa. Ou, preferivelmente, uma casa de repouso. Mas há novos paradigmas para o idoso. Avanços da neurociência, a plasticidade cerebral, a regeneração do cérebro. Conceber a velhice como período de novas aquisições. Há velhices bem-sucedidas. Basta saber que é possível fazer novos neurônios até o final da vida. É algo comprovado pela ciência. O velho que ama, na verdade, ainda não é velho. Ao contrário, o jovem que não ama, este sim, é um idoso sem remédio prescritível.









* José Renato Nalini, secretário da Educação do Estado de São Paulo, Imortal da Academia Paulista de Letras e Membro da Academia Brasileira da Educação. 
Visite o blog: renatonalini.wordpress.com.



terça-feira, 27 de setembro de 2016

EDUCAÇÃO.
Por José Renato Nalini*

Escola do futuro.

A Escola do Futuro deveria ter começado há um século. Mas não é o Brasil que está em déficit com o adequado planejamento educacional. É a humanidade. Em todos os países, a escola ainda tem a mesma fisionomia. Alunos enfileirados, o último da fila só enxerga as nucas dos seus colegas à frente. Aulas prelecionais. Disciplinas teóricas, nem sempre vinculadas com o interesse dessa geração cuja circuitaria neuronal é digital. Continuamos todos analógicos. O ambiente educacional está precisando de um choque. Daqui a alguns anos, mais da metade das profissões hoje existentes não mais existirão. Temos de preparar a juventude para atividades laboriais hoje ignoradas. Mais do que isso, temos de prepara-las para poder mudar de ramos sem traumas, assim que se tornar necessário.

Ou seja: a educação tem o desafio de formar pessoas polivalentes, aptas ao enfrentamento de incertezas e novidades. Hábeis em inovar e empreender. Corajosas, compreensivas, peritas em convívio e em trabalho cooperativo. A boa notícia é que a Escola do Futuro já está disponível. Quinze mil professores já gravaram aulas no Youtube e elas estão acessíveis a quem queira aprender. Centro e oitenta e um mil alunos se inscreveram para usufruir dessa aula turbinada. Alguns se miram no exemplo dos cursinhos. Outros fazem “rap”, outros ainda se utilizam de estilo repentista. Cada qual procurando tornar sua aula mais agradável, para cativar um alunado muito sábio, se tiver curiosidade e pesquisar na rede.

Estamos mergulhados na 4ª Revolução Industrial e precisamos navegar nesse mar revolto das mutações continuas, estruturais, profundas e impactantes. Os nativos digitais querem outra escola. É por isso que precisamos investir na informatização, na oferta gratuita de wi-fi, no uso pedagógico dos smartphones e de todas as outras bugigangas eletrônicas que nos permitem estar em várias partes do globo, on line e simultaneamente. O mundo novo chegou. Quem não se aperceber disso terá o mesmo destino dos dinossauros.









* José Renato Nalini, secretário da Educação do Estado de São Paulo, Imortal da Academia Paulista de Letras e Membro da Academia Brasileira da Educação. 

segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

JUSTIÇA.
Por José Renato Nalini*

NÃO É HORA DE PARAR.

A situação brasileira atinge o inimaginável. Indefinição política paralisa o País. Falta de arrecadação resulta em falta de orçamento. Cessam os investimentos. O Brasil é rebaixado pelos organismos encarregados de avalizar nosso grau de confiança. O desalento generaliza-se. O que fazer?

O povo tem pressa. Não há condições de tergiversar e deixar de fornecer rumo para a Nação que, se o governo não atrapalhasse, poderia deslanchar. Tem tudo para isso. Povo, clima, vontade de vencer.

Se os responsáveis pelas políticas públicas foram chamados a um protagonismo singular, pois deles depende o desate dos nós, não é razoável que haja recesso. Descansa-se quando não existe urgência, nem risco para a saúde das instituições. Estamos num momento crítico, para o qual toda a reflexão ainda é pouca, tais os perigos a que submetidas as futuras gerações, ante a falta de visão e a multiplicação dos “malfeitos” de tantos irresponsáveis.

Sempre fui pessoalmente contrário a paralisações no Judiciário. Se Justiça é bem da vida essencial, assim como a saúde, não há como interromper sua prestação. Hoje é fácil a comunicação pela internet. Mais de 90% da população em idade útil no Brasil navega pelas redes sociais. Não é impossível manter contato com a autoridade judiciária responsável em qualquer dia, a qualquer horário.

Aliás, foi a ideia que propus ao TJSP, ao advento da Constituição de 1988, que previu a apresentação imediata do preso em flagrante à autoridade judiciária competente. Compromisso que o Brasil já assumira ao assinar o Pacto de San José da Costa Rica em 1970, ratificado em 1992, mas que só foi cumprir em 2015, por iniciativa do TJSP e do CNJ, com o projeto audacioso e exitoso das audiências de custódia.

Se isso vale para a Justiça, com razão maior para o Parlamento. Não faz sentido aguardar até fevereiro para resolver questões mais do que urgentes. Urgentíssimas e importantíssimas. A Nação tem pressa e tem razão ao exigi-la. Vamos manter em funcionamento os três Poderes. Há períodos da História em que se reclama seriedade, consistência e responsabilidade. Este final de 2015 é um deles.    









José Renato Nalini é desembargador, preside o Tribunal de Justiça de São Paulo e é integrante da Academia Paulista de Letras.
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quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

JUSTIÇA.
Por José Renato Nalini*

VISÃO EQUIVOCADA.

No momento em que a expectativa de vida do brasileiro merece acréscimo e passa ao patamar de 75,2 anos, duas associações de magistrados ingressam com ação direta de inconstitucionalidade contra a Lei Complementar nº 152, de 3.12.2015, que permite a aposentadoria compulsória aos 75 anos.

Compreende-se que as entidades associativas atendam aos interesses dos associados mais novos, ávidos por galgar os derradeiros patamares da carreira da Magistratura e, portanto, para se livrar do entulho etário.

Interessante país o Brasil. Aos 60, rotula as pessoas com o qualificativo "idoso". Aos 70, as tornava descartáveis. Por economia, resolveu-se ampliar a expulsória para os 75 anos. Enquanto isso, o IBGE, na pesquisa Tábua Completa de Mortalidade, detecta o aumento da esperança de vida e impõe a racionalidade de mudar o tratamento conferido à idade provecta.

O limite de 70 anos para a compulsória data de uma fase em que a expectativa de vida para os homens era de 42,9 anos e para as mulheres 48,3 anos. Hoje, elas continuam à frente, com 78,8 anos. Evidente que isso causa impacto no cálculo da previdência. O brasileiro vive mais e, portanto, ficará mais tempo na dependência do Erário. E este não anda em seus melhores dias, como é notório.

A despeito dos fracassos e das tragédias que acometem a República, o brasileiro vive mais. Esse o lado bom. O aspecto cruel é que essa longevidade torna ainda mais precária a situação financeira da Previdência Social.

Nem isso foi levado em conta pelas associações que deixam os mais idosos de lado e defendem os interesses dos mais jovens. Na certeza iludidos quanto à inevitável passagem dos dias. Juventude é fase que não dura muito. Dentro em pouco, os jovens de hoje estarão na torcida para que possam permanecer um pouco mais a desenvolver trabalhos que não necessitam de força muscular ou de provas físicas de atletismo.

Já cheguei a propor que os concursos públicos de provas e títulos para as carreiras jurídicas se fizessem para o último estágio na corrida de obstáculo até chegar ao ápice. Jovens seriam nomeados desembargadores e procuradores ao final do certame. Começariam colegiadamente e, com o passar do tempo, adquiririam maturidade para julgar sozinhos. Terminariam como juízes e promotores substitutos em comarcas menores, que saberiam reconhecer sua experiência e sapiência adquirida no decorrer dos anos. 

Forçados a se aposentar, os experientes lamentam, mas também já foram jovens e se equivocaram. Nem por isso aplaudem a atuação de associações que atuam com parcialidade e que negam a evidência de que o sistema previdenciário explodirá e então todos – jovens e velhos – estarão em situação aflitiva, pois a questão é meramente atuarial. Menos contribuição, mais benefícios, a conta não fecha.

Coisas de um Brasil que privilegia o individualismo, o egoísmo, o consumismo e enterra a solidariedade, a fraternidade e a compaixão pelo semelhante.









José Renato Nalini é desembargador, preside o Tribunal de Justiça de São Paulo e é integrante da Academia Paulista de Letras.
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domingo, 20 de dezembro de 2015

JUSTIÇA.
Por José Renato Nalini*

NOSTALGIA DE NATAL.

Nem todos se alegram com a chegada do Natal e Ano Novo. Muitos são acometidos de uma certa nostalgia, própria a quem mescla o sentimento inspirador de harmonia, paz, convívio fraterno a um laivo de tristeza sem qualquer explicação racional.

Muitas são as causas desse misto de angústia com saudades, tudo revestido de emoção. Qual a explicação para esse fenômeno?

Há quem se recorde de Natais da infância, onde alguns desejos não foram satisfeitos. Crianças sonham e têm anseios insuscetíveis de atendimento. Frustram-se e ficam estigmatizadas. Outros se comovem porque pessoas queridas já não estão neste mundo. Sua falta é muito mais enfatizada nesse período. Entes com cadeira cativa no afeto eternal nunca mais participarão de ceias, trocas de presentes ou de abraços com a formulação de votos tradicionais. Isso é muito doloroso!

O artificialismo desses cumprimentos forçados consegue desmotivar muita gente e a torna um pouco cética em relação à sinceridade com que são formulados. Por que essa obrigação de desejar “Feliz Natal”, mesmo a pessoas que não estão na lista de predileção de quem profere a saudação? 

A expectativa de quem aguarda os tradicionais presentes natalinos é também algo que pode irritar. Cresce a relação daqueles que aguardam regalo, agrado e lembrança. O esquecimento de um personagem que deveria ter sido contemplado incomoda o esquecido, mas não menos aquele que deveria ter se recordado dele. Há muito ressentimento gerado por essa situação. O interesse pessoal – ou personalíssimo – faz com que se esqueça o motivo das festas. Por que se comemora o Natal?

Natal é celebração do nascimento de Jesus. Para os cristãos, o Messias. O Salvador. O elo entre a Humanidade e o Criador. Restabelece a aliança entre Deus e a criatura. Essa a razão de ser de uma comemoração natalina. Isso é o que deve merecer reflexão nesta época. 

A tristeza contida nas músicas natalinas reside nessa enorme série de sensações por elas geradas. A música é uma linguagem milagrosa. Transporta quem ouve seu som mágico a espaços ignotos e a territórios distantes e, talvez, nunca pressentidos. Inebria, toca a alma, sensibiliza e enternece. Com certeza, é o caminho mais adequado para recuperar o verdadeiro espírito de Natal, que deve trazer esperança, bons propósitos, expectativas as mais alvissareiras, não tristeza, angústia ou desconforto.

Neste ano, principalmente, precisamos de alento para o enfrentamento de um 2016 que se prenuncia tão dramático e preocupante como foi 2015. Peçamos ao Menino que nos inspire, nos anime e nos municie de confiança no porvir que teremos de enfrentar, alegres ou não. 










José Renato Nalini é desembargador, preside o Tribunal de Justiça de São Paulo e é integrante da Academia Paulista de Letras.
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sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

JUSTIÇA.
Por José Renato Nalini.

MISSÃO ENCERRADA.

Termino, dia 31 de dezembro de 2015, a minha gestão à frente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Reconhecidamente, o maior tribunal do mundo: mais de 50 mil funcionários, quase 3 mil magistrados, 26 milhões de processos em curso.

Experiência fascinante. Um Tribunal com essas dimensões oferece desafios e complexidades compatíveis com sua envergadura. Sem o devotamento de muitas pessoas, é impossível fazê-lo funcionar ou manter em funcionamento.

Sou grato a colegas, a funcionários, a parceiros e à grande família interessada no contínuo aperfeiçoamento do sistema Justiça.

Tentei dialogar com a sociedade e procurei fazê-lo de forma permanente. Por acreditar que Justiça é algo sério demais para ser confiado à exclusiva discricionariedade dos profissionais da área jurídica. É equipamento público, serviço estatal sustentado por todos. Em 2014, cada brasileiro despendeu 348 reais para a manutenção do Judiciário, tenha ou não dele se utilizado.

Formei um Conselho Consultivo Interinstitucional, chamando funcionários, magistrados e personalidades para opinar sobre a missão de repensar o sistema Justiça. Procurei estabelecer parcerias, convênios, protocolos de intenção e toda aproximação possível com entidades como FIPE - Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas, FGV SP e RIO, Associação Brasileira de Jurimetria, Secretaria da Reforma do Judiciário, FEBRABAN, SECOVI, FIESP/CIESP, ASSOCIAÇÃO COMERCIAL, UNIVERSIDADE, empresas e instituições financeiras. A Justiça interessa a todos e ninguém está excluído do dever de colaborar com o seu contínuo aprimoramento.

Intensificou-se o Projeto Digitalização 100% e um mês antes do término do mandato, atingiu-se a meta. Meta definida, estabelecida, perseguida e alcançada. O último processo em papel no Judiciário paulista deu entrada em 30 de novembro de 2015, exatamente na Comarca de Registro. Daqui para a frente, prenuncia-se o desaparecimento de arquivos, prateleiras, carimbos, juntadas e transporte físico de autos. Os funcionários são capacitados para trabalho eminentemente intelectual. Quem quiser e se aplicar, terá um destino muito mais instigante do que a rotina burocrática.

Não se descuidou da gestão. Implementou-se a experiência do "Cartório do Futuro", que é, na verdade, uma unidade judiciária de produção padronizada de serviços, apta a tender a dez juízes. Um ponto relevante desse esquema é a quebra do paradigma patrimonialista da apropriação de funcionários e de um isolamento que não produz com a racionalidade e celeridade exigidas pelo jurisdicionado.

Também se instalou a Unidade Remota de Processamento de Dados, pronto socorro para atender a necessidades de todas as unidades jurisdicionais do Estado. Foi valiosa a experiência do teletrabalho, antigo "home office", que mostrou maturidade de juízes, chefes e funcionários e ofereceu resultados surpreendentes. 

A segurança e incolumidade física de todos os frequentadores dos Fóruns foi objeto de preocupação da Presidência, que obteve, graças ao trabalho da Assessoria Policial Militar, o Prêmio 'Mário Covas' de vulnerabilidade dos próprios judiciais, concorrendo com centenas de outras iniciativas. 

A deficiência orçamentária e a decrescente participação do Tribunal de Justiça na receita geral do Estado não impediram a implementação de benefícios criados na gestão anterior, como a gratificação cartorária e o adicional de qualificação. Nem a transformação dos agentes em escreventes. Todos os Foros Distritais foram promovidos a Comarcas, duplicou-se o pagamento de débitos trabalhistas para com os servidores e estes obtiveram voz e vez junto à cúpula, garantida a participação das Associações de classe nas sessões administrativas do Órgão Especial. Os principais pleitos junto à Assembleia Legislativa mereceram apoio da Presidência e várias conquistas podem ser inscritas nesse biênio. Que o diga o PL 56/2013.

Em compensação, não houve greve no serviço da Justiça de São Paulo nesses dois anos. Nem episódios cruentos ou estranhamentos com parceiros como OAB, MP e Defensoria.

Orgulho-me do Projeto de Resgate da Memória Histórica do Tribunal, com a homenagem prestada a vultos célebres do Judiciário paulista em sessões de muita emoção e cuja importância maior foi injetar vitamina de legítimo orgulho em combalida autoestima da nacionalidade. Nomes tutelares e dignos de reverência denominam hoje todos os Fóruns do Estado, com a comemoração do "Dia do Patrono", legítimo culto à tradição. E entrou música, dança, teatro, filosofia e motivação de toda a ordem na promoção "Arte e Cultura na Justiça". 

O recado principal foi mostrar à população que o Judiciário não tem condições de atender a todas as demandas, sobretudo aquelas mais singelas, que podem ser resolvidas com diálogo e boa vontade. Não é saudável uma Nação com 106 milhões de processos! Isso é patologia. Precisamos dos advogados e de todos os demais parceiros para disseminar a cultura da conciliação. Por isso é que já atingimos 150 CEJUSCs em São Paulo. Muitos mais virão e essa a alternativa a um sistema Justiça congestionado e que precisa ser liberado para decidir as grandes questões. 

Talvez a missão não tenha sido cumprida. Mas viu-se encerrada por decurso de tempo. Que novas gestões completem a obra interminável, que não é personalista, mas procura atender às expectativas da razão de ser do Judiciário: o jurisdicionado. 









José Renato Nalini é desembargador, preside o Tribunal de Justiça de São Paulo e é integrante da Academia Paulista de Letras.
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quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

JUSTIÇA.
Por José Renato Nalini.

MEMÓRIA DA AMNÉSIA.

Com esta denominação, inaugura-se no Arquivo Histórico de São Paulo, à Praça Coronel Fernando Prestes, 152, Luz, uma exposição insólita: os monumentos órfãos da capital. São estátuas, partes de grandes grupos que foram desfeitos e esculturas relegadas ao esquecimento.

Não é preciso enfatizar que São Paulo não tem apreço por seu patrimônio. Quem frequenta o centro e ainda tem olhos para enxergar, não pode se conformar com a pichação da Sé, da Faculdade do Largo de São Francisco e de todas as outras edificações que em país civilizado mereceriam respeito e adequado tratamento.

Não é de se estranhar, portanto, que peças elaboradas para ornamentar locais públicos tenham sido destruídas, vandalizadas e retiradas de seus pedestais. Quantas outras, além destas dezesseis esculturas cuja mostra abriga até o dia 25 de fevereiro de 2016, não desapareceram por negligência do Poder Público, em seguida à ausência de um mínimo de educação por parte do povo?

A proposta da historiadora e professora da FAU-USP Giselle Beiguelman é mostrar como anda a memória paulistana. O que levou tais peças ao desterro e, depois, ao ostracismo?

O monumento a Federico Garcia Lorca, morto na Guerra Civil espanhola aos 38 anos em 1936, foi alvo de atentado e praticamente destruído. Recuperado por Flávio de Carvalho, causou polêmicas na Bienal e, sequestrada por alunos da ECA, finalmente retornou à Praça das Guianas. 

"O Beijo", hoje diante da maltratada Escola de Direito do Largo de São Francisco, foi esculpido para integrar um grande monumento em homenagem a Olavo Bilac. Em São Paulo, com a sua tradicional falta de consenso, nem as estátuas ficam em sossego. Assim é que se elaborou até mesmo uma "saga" da estatuária paulistana, com categorias estabelecidas pela pesquisa da mostra. Há estátuas banidas, monumentos considerados como atentado ideológico ou ao pudor e retirado dos logradouros públicos, as clonadas, que são cópias de outras mas expostas como originais, as engradadas, pois cercadas por grades, as invisíveis, escondidas atrás da vegetação e as enclausuradas que, confeccionadas para exibição em público, hoje estão em espaços privados.

A propósito, São Paulo já teve o seu "Jardim dos Escritores", no Largo do Arouche, defronte à Academia Paulista de Letras. Ali eram entronizados bustos de intelectuais para marcar o espaço da literatura. O Governador Geraldo Alckmin, quando Prefeito de Pindamonhangaba, veio inaugurar o busto de outro pindamonhangabense ilustre, José Augusto César Salgado, autor do Decálogo do Promotor Público e que também integrou a APL.

Hoje, o Jardim está abandonado. Bustos desapareceram. Até mesmo os blocos de granito que serviam de suporte foram arrancados. Triste sorte de uma cidade mal amada, que tem de gastar mais de um bilhão por ano apenas para recolher o lixo produzido por seus habitantes.

Tudo isso explica a lamentável situação da República imersa em desalento, descrença e desânimo, com uma educação capenga e que só tem servido para alimentar personalismos e servir de palanque aos ambiciosos. Triste sina a desta Terra de Santa Cruz.









José Renato Nalini é desembargador, preside o Tribunal de Justiça de São Paulo e é integrante da Academia Paulista de Letras.


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quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

JUSTIÇA.
Por José Renato Nalini.

FALTA DE SOLIDARIEDADE.

A judicialização da saúde pode ser encarada sob diversas óticas. Como pressuposto, penso que não é necessário insistir na constatação desse fenômeno. Ao converter a saúde em direito universal, a Constituição da República abriu espaço para que todo e qualquer pleito chegue ao Judiciário e com escassa chance de merecer indeferimento. O resultado é a inviabilidade de qualquer projeto sério, no âmbito municipal, diante do vulto dos interesses atendidos.

Há quem sustente a higidez do sistema. Afinal, o acesso à Justiça foi assegurado e todos aqueles que tiverem necessidade terão um juiz à disposição para ordenar que o município propicie internação, dentro ou fora do Brasil, medicamento ainda em teste ou não aprovado pelas autoridades competentes, próteses, tratamentos e tudo o mais o que se oferecer nesse mercado florescente que é o da saúde integral.

Mas a conta não está fechando e o município é o maior prejudicado. É muito difícil cobrar as obrigações da União e um pouco menos exigi-las do Estado-Membro. Mas é muito fácil citar o Prefeito para que atenda a toda e qualquer pretensão.

O Estado brasileiro encontra-se em situação falimentar. São pedaladas e artifícios que já não encobrem o quadro trágico: os direitos prodigalizados pela Constituição e a multiplicidade de agentes formados sob a única visão de todos os problemas – entrar no Judiciário – tornam inadministrável a Prefeitura.

Embora o juiz tenha sido exortado pelo CNJ a ser consequencialista, examinar com prudência quais serão as consequências de sua decisão no mundo real e não na ficção jurídica, isso em regra ainda não se faz. Toda política pública de saúde se vê inviabilizada porque aqueles que têm acesso ao Judiciário raparam o cofre e não deixaram recursos financeiros para a legião dos desassistidos.

Em recente reunião, à qual estiveram presentes especialistas de várias áreas, ouvi uma observação interessante: a judicialização da saúde é outro exemplo da falta de solidariedade que acometeu a população brasileira. Cada um só pensa em si e não tem o menor interesse em saber se o atendimento de sua demanda prejudicará o próximo. Às vezes, muito mais necessitado do que o demandante, que teve o privilégio de acessar o Judiciário, sempre pronto a examinar o caso concreto, o direito daquele que ingressou com a ação e desprovido de condições de contextualizá-lo numa Nação em que a exuberância de direitos só encontra paralelo na fragmentação dos valores mais essenciais a um convívio verdadeiramente fraterno.










José Renato Nalini é desembargador, preside o Tribunal de Justiça de São Paulo e é integrante da Academia Paulista de Letras.


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quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

JUSTIÇA.
Por José Renato Nalini.

SE MAIS NÃO FIZ...

...não foi por falta de vontade. Sei que há um fosso praticamente intransponível entre a intenção e a concretização. Gostaria de ter visitado todas as repartições e conversado com todos os funcionários. O asserto de que eles são o nosso maior patrimônio não é retórica. Sonho com a restauração do conceito de "família forense", pois a coesão entre idealistas só pode resultar num produto melhor. E o nosso produto é essencial. Sem justiça, não se aprimora o convívio, nem se implementa a Democracia Participativa.

Gostaria de ter implementado as Varas Ambientais, agora que já se consolidou a experiência das Câmaras Reservadas ao Meio Ambiente. Assim como as Varas Fundiárias, pois o tema da regularização dominial é candente. Persiste e é tensional. Posições arraigadas de todos os lados tornam esse conflito uma granada pronta a explodir.

Gostaria de ter atendido às reivindicações legítimas. Administrar escassez é especializar-se em dizer "não". É doloroso indeferir, quando se sabe que o pedido é justo. 

Gostaria de ter visitado todas as Comarcas e todos os municípios integrantes de cada uma delas. Principalmente aqueles que ainda não têm uma unidade judiciária em funcionamento. Assim como teria ficado feliz ao multiplicar os postos avançados, a implementação das justiças itinerantes e outras estratégias de efetivar a presença do juiz, ainda que não em tempo integral, em todas as comunidades.

Gostaria muito de ter implementado a ideia de "Casas da Justiça", que Celso Cintra Mori me apresentou e que seria uma espécie de "Poupa-Tempo da Justiça". Assim como alavancado o projeto de reinserção do egresso em larga escala. Fórmula de fazer a sociedade refletir sobre as causas do aumento da violência praticada por crianças e adolescentes.

Teria me alegrado com a multiplicação ainda mais acelerada dos CEJUSCs, Centros Judiciais de Solução de Conflitos e de Cidadania, com a adoção das práticas do NECRIM, a cargo dos Delegados de Polícia e introdução do ciclo completo para a Polícia Militar, além da obtenção do envolvimento de todos os advogados para o "OAB concilia". 

Frustrou-me não merecer a solução do CNJ quanto à conciliação nos serviços extrajudiciais, introduzida pelo Provimento 17/2013, que editei quando Corregedor Geral da Justiça e que teve sua eficácia suspensa monocraticamente e não obteve decisão colegiada durante estes dois anos. Assim como fico desalentado ao não conseguir solucionar a questão dos arquivos de processos findos. Não fico em paz sabendo que o povo paga milhões para a guarda de feitos que poderiam ser entregues a quem se interessasse, Faculdades, Arquivos Públicos e particulares, Bibliotecas, Escritórios de Advocacia ou mesmo às partes. Consola-me saber que ao menos pusemos um paradeiro nessa kafkiana juntada de toneladas de papel, com a adoção do projeto "Digitalização 100%".

Não consegui também levar a Justiça de Segunda Instância para as sedes das Regiões Administrativas Judiciárias, conforme pensei de início, para poupar viagens de advogados e mesmo de julgadores. Conforta-me o fato de que a digitalização permitirá a quem tiver vontade de enfrentar as questões urgentes uma decisão a qualquer hora, em qualquer lugar, desde que disponível um equipamento de informática. 

O rol das frustrações poderia ser maior. Mas não é o único produto de uma gestão que terminará em dezembro, da qual levo também muitas boas lembranças. Estas virão em seguida, se os leitores tiverem paciência para ler.

ET: A presidência do TJSP encerra-se para o seu atual titular antes de 24.12.2015, quando atingirá o limite constitucional para permanecer na Magistratura.











José Renato Nalini é desembargador, preside o Tribunal de Justiça de São Paulo e é integrante da Academia Paulista de Letras.

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sexta-feira, 20 de novembro de 2015

JUSTIÇA.
Por José Renato Nalini*

INDIGÊNCIA ÉTICA.

As notícias ambientais no Brasil são as piores. Já sepultamos o princípio da vedação do retrocesso em relação ao Direito Ambiental. A tragédia de Mariana é um passo a mais em direção ao morticínio da fauna e da flora. Com reflexos nas pessoas. O discurso antropocêntrico é insuficiente para debelar os males causados pelo veneno que se espalhará por centenas de quilômetros e levará centenas de anos para desaparecer. 

O fenômeno "El Niño" é pouco para explicar as chuvas no sul, a seca no nordeste. O "Velho Chico" praticamente seco. Mas a transposição, tão econômica, não para. Realmente, é uma obra que sanará a seca e compensará os bilhões despendidos.

A ciência continua a mostrar as consequências de nossa crueldade em relação à natureza. Na melhor hipótese, nível do mar em Santos subirá 18 centímetros até 2050. Claro que poderia dizer: não estarei vivo, então o problema é de quem fica. Mas as coisas podem se precipitar. Há algumas décadas, falava-se em fenômenos que ocorreriam dentro de um século. Aconteceram muito antes.

O cenário catastrofista do filme "O Dia Depois de Amanhã", de 2004, pode se converter em realidade. O IPCC, painel de cientistas mundiais que investiga as mudanças climáticas, fala numa subida média do nível do mar entre 28 e 89 centímetros. A causa disso é o aquecimento global. Coisa que não levamos a sério e que insistimos em ignorar. 

A recomendação dos cientistas é a construção de anteparos móveis, dentro do mar, para evitar que o aumento das águas atinja ruas, prédios e casas. Outra coisa é construir prédios palafitas, sem garagem. De repente, Santos se tornará uma Veneza...

Mesmo com a carnificina da sexta-feira 13, Paris continuará a sediar o encontro internacional sobre o clima do próximo dezembro. Enquanto cientistas estrangeiros se preocupam bastante, inclusive o inglês David King, representante especial do Ministério das Relações Exteriores Britânico, nós fazemos de conta que não é conosco. King leva a sério a verdade científica: "A Inglaterra é uma nação-ilha! Estamos cercados por oceanos!". Se eles subirem, poderão engolir a sede do Império onde o sol nunca se punha...

O britânico fala em planejamento familiar, em educação da menina para não engravidar precocemente, o que vem a coincidir com a advertência do médico brasileiro ao tratar dos bebês com microcefalia: "Por cautela, não engravidem!". Mas o bolsa-família estimula exatamente o "crescei e multiplicai-vos". O futuro dirá o que deveria ter sido feito. Mas não poderá ser tarde demais?











José Renato Nalini é desembargador, preside o Tribunal de Justiça de São Paulo e é integrante da Academia Paulista de Letras.
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terça-feira, 17 de novembro de 2015

JUSTIÇA.
Por José Renato Nalini*

O ÁLCOOL TRAIDOR.

Dentre as chamadas drogas lícitas, o álcool talvez seja a mais ruinosa. Seu consumo converte pessoas civilizadas em selvagens. Aquilo que não se teria coragem de dizer na sobriedade, é proclamado com insistência pelo embriagado. O bêbado é um corajoso. Não hesita em disparar contra seus alvos. 

Há quem beba exatamente para extravasar o que sente em relação à vida e aos semelhantes. O que ficou entalado, o que se pensou e não se teve coragem de afirmar, os mais recônditos ressentimentos e complexos afloram, ganham forma e força.

O estrago está feito. Proferida a ofensa, ela se concretizou. Não se recolhe a palavra dita. É flecha disparada que muita vez atinge, certeiro e duro, o coração de quem se era o alvo e se pretendeu ferir. Mas é importante saber que ninguém atinge uma embriaguez completa, que o prive de todo o discernimento. O álcool apenas enfatiza o que já se ocultava sob uma pálida polidez, sob aquele véu diáfano da boa educação. O sopro alcoólico arremete longe esses escrúpulos. O que se diz no estado etílico é o que se queria mesmo dizer.

Conhece-se realmente a pessoa quando ela se despe das convenções e atribui à bebida o "exagero". Aí ela se mostra por inteiro. Com a sua franqueza, sinceridade, crueza e crueldade. 

Quantas amizades desfeitas são atribuídas a uma bebedeira! Quantas agressões, quanta valentia, quanta desfaçatez!

Mesmo assim, o álcool é uma isca atraente, que aprisiona o mais fraco, lançando-o à arapuca onde ele tem de ser quem é. Não é o outro que surge como resultado da bebida. É o ser autêntico, sem o disfarce que um convívio forçado, mas civilizado, faz com que as pessoas se fantasiem.

Sem a roupagem do constrangimento, ao qual o sóbrio não se exporia, o bêbado mostra a verdadeira face. Irreconhecível para quem o não conhecia sem disfarce. Maldosa, porém verdadeira. Liberados os freios que as relações não embebidas no álcool preservam, tudo se torna possível. A violência verbal, a violência física, a ameaça, as ofensas, os gestos ousados de valentia.

Pobre animal humano, tão prepotente e tão ridículo, quando se entrega à miséria do alcoolismo.










José Renato Nalini é desembargador, preside o Tribunal de Justiça de São Paulo e é integrante da Academia Paulista de Letras. 
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quarta-feira, 11 de novembro de 2015

JUSTIÇA.
Por José Renato Nalini*

CARA IMUNDÍCIE.

O município de São Paulo gasta um bilhão de reais por ano com a coleta de lixo. O tratamento de enfermidades decorrentes do descarte inadequado de lixo custa 370 milhões de dólares ao sistema de saúde pública do Brasil. 

Temos mais de três mil lixões e a constatação de que esse dispêndio é insano para uma Nação com os nossos problemas foi feita pela International Solid Waste Association – ISWA, em parceria com o Sindicato das Empresas de Limpeza Urbana e com a Associação Brasileira de Empresas de Limpeza.

A forma pela qual a população se libera de seus resíduos sólidos é o maior atestado da falta de verdadeira educação do brasileiro. É comum encontrar trechos de passeios repletos de lixo. Assim como não é raro verificar que pessoas ocupando veículos de luxo jogam de dentro tudo o que não serve mais, sem se preocupar com o destino desse descarte.

Cerca de 75 milhões de brasileiros têm seus resíduos recolhidos em lixões ou quaisquer outros espaços impróprios. Os principais afetados por essa ausência absoluta do menor índice de educação cívica são os moradores das proximidades dos lixões, os catadores de materiais recicláveis e os trabalhadores na limpeza urbana. Toda forma de propagação já foi registrada no Brasil: contamina-se a pessoa vulnerável por uso de água poluída, contato com o solo envenenado, ar empesteado, fauna e flora já comprometidas. 

A percentagem da população que efetivamente contrai as doenças não é grande. Mas o custo para o SUS no tratamento delas é de 500 dólares por pessoa. Por isso a estimativa de custos anuais supera 370 milhões de dólares e totalizará 1,85 bilhão em cinco anos. 

A menos... A menos que os governos tivessem juízo e adotassem uma política eficaz e agressiva de "poluição zero". A mera existência de "lixões" depõe contra o Brasil. "Lixão" é coisa de quinto mundo, não da sétima economia mundial.

Com o maior desemprego que já se atingiu no Brasil, não custaria para os governos a contratação parcial desses desamparados pela proteção trabalhista, para que procedam a um trabalho conjunto: ao mesmo tempo em que recolhem os resíduos deixados em espaços que para tal não são destinados, podem educar a população a se servir de recipientes adequados para o descarte e a levar a sério essa advertência da ISWA. Se isso não vier a ser feito – e com urgência – morreremos no lixo. O pior, é que mereceremos tal punição.











José Renato Nalini é desembargador, preside o Tribunal de Justiça de São Paulo e é integrante da Academia Paulista de Letras. 
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quarta-feira, 4 de novembro de 2015

JUSTIÇA.
Por José Renato Nalini.

REINVENTE-SE COM URGÊNCIA.

A única certeza do mundo contemporâneo é a incerteza. Mas a mudança é hoje muito mais rápida do que em outra época. Basta verificar algumas coisas. O fenômeno UBER não ocorre só aqui no Brasil. Os taxistas de Londres também estão mal humorados. Também os hoteleiros disputam a busca por quartos com o Airbnb, que loca espaço em casas particulares. Os fabricantes de computadores encontram concorrência com os provedores de computação na nuvem. A TV digladia com a internet. Os jornais já não precisam ser folheados. Revistas semanais ou mensais desaparecem como moscas fulminadas por inseticida.

A reinvenção é a regra e quem não perceber perecerá. Onde estão hoje os que viviam dos outdoors que enfeavam a capital paulista? Sobreviveram com a exploração de outros nichos. E aqueles que, mais remotamente, fabricavam papel carbono? E o mata-borrão? E os filmes das antigas máquinas fotográficas? E elas mesmas? E as máquinas de datilografia?

Tudo muda. Tudo passa. Pode ser que demore, mas dia chegará em que as pessoas perceberão que não têm todo o tempo do mundo para aguardar decisões da Justiça. Decisões muitas vezes periféricas. Acabam com o processo, dando uma resposta meramente procedimental, formalística ou processual em sentido estrito. Mas o problema continua lá. Agravado pela sensação de perda de tempo e de dinheiro. Frustração por haver confiado no Judiciário e ter dele recebido uma resposta incompleta. Ininteligível se não houver um decodificador para dizer o que aconteceu com um prejuízo concreto, uma dor consistente, uma honra que só o lesado sabe avaliar. 

Os conflitos de interesse, as preocupações, as aflições derivadas de um convívio difícil, a par de machucarem a alma, custam dinheiro. E dinheiro custa a ganhar. 

Aos poucos, descobrir-se-á que alinhar interesses, forjar-se uma cultura do diálogo que valorize o comprometimento com a franqueza e a camaradagem, trará menos dissabores do que ingressar em juízo. Este ingresso poderá ser inevitável, mas, antes do passo fatal, haverá de se tentar um acordo. Conciliar é a solução. Litigar pode ser um problema a mais. A não ser para quem não tem razão, não quer honrar suas obrigações e tem todo o tempo do mundo para exasperar a parte contrária. 

Mas não é para estes que o Judiciário procura disseminar a cultura da conciliação, da negociação, da mediação e de outras estratégias que realmente significam a pacificação, não o incremento do mundo desumano do processo: todos contra todos e todos perdendo a final.










José Renato Nalini é desembargador, preside o Tribunal de Justiça de São Paulo e é integrante da Academia Paulista de Letras. 
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